A banda do esquisitão Chris Martin pôs ontem no seu site um álbum de nove faixas extraídas de apresentações ao vivo da turnê do álbum “Viva La Vida”. É pra baixar de graça. Em troca, você dá apenas o seu e-mail e diz qual o seu país. Há uma limitação de número de downloads, então os fãs precisam ser ágeis. Mais do que isso, a banda ainda queimou algumas cópias físicas deste CD (chamado “LeftRightLeftRightLeft”) e vai distribuir também gratuitamente aos fãs durante todas as apresentações que ainda restam ser feitas na turnê do álbum “Viva La Vida”. Como banda de rock inglesa que se preza tem que tocar pelo menos um final de semana no estádio de Wembley, será desse jeito apoteótico que os caras encerraram essa jornada em setembro.

É de se ficar atento aos movimentos que a EMI vem tomando junto ao Coldplay. A banda é considerada o principal artista global da companhia atualmente. O lançamento de “Viva La Vida” foi imediatamente posterior a uma saraivada de críticas feitas à gravadora, sobretudo ao seu departamento digital. Robbie Williams saiu detonando a empresa publicamente, os Stones negociaram um álbum inteiro com a Universal e muitos outros se insurgiram contra a major. Isso tudo poucos meses depois de a empresa ter sido comprada pelo grupo financeiro Terra Firma e começar uma remodelagem mundial, que envolveu cortes de postos, rearranjo de equipes e escritórios e estratégias, e que tinha no Coldplay sua primeira ação própria, totalmente sob o comando dos novos donos. Lembrando que tudo isso foi numa época em que ainda não se imaginava a “surpresinha” que Wall Street reservava ao mundo no fim de 2008.

Ainda na coincidência e referência de datas importantes, o tal lançamento era a primeira ação grandiosa que a companhia preparava após o lançamento de “In Rainbows”. Na mesma época em que o Terra Firma comprava a EMI, a banda de Thom Yorke dizia ao mundo que o seu próximo disco seria o primeiro a não sair pela gravadora. Depois do lançamento bombástico e surpresa em outubro de 2007, não se podia mais pensar em negócios digitais da música da mesma forma. O Radiohead abriu as cartas para a geração calda longa dizer quanto queria pagar.

E agora, quanto vale o show? É curioso que o Coldplay dê uma de Calypso e ofereça o registro de suas performances ao vivo como brinde aos fãs. Para quem não acompanhou, o álbum “Viva La Vida” deu as caras via web, quando no fim de abril de 2008 a banda lançou em seu site a música “Violet hill” para download gratuito durante uma semana, mediante cadastro. Era o primeiro passo voltado para as três letrinhas mágicas da indústria da comunicação atualmente: CRM (Consumer Research Management). Depois, se “arriscando” numa nova experiência (pelo menos para quem sempre esteve preso aos formatos padrões de distribuição fonográfica da indústria), entregaram o vinil desta música, junto com uma faixa inédita, para ser distribuída com a revista NME. Na semana de lançamento do álbum, fizeram shows abertos e gratuitos em Londres e em Nova York, sendo que o primeiro com transmissão ao vivo para toda Inglaterra via BBC. Algumas ações instantâneas foram realizadas via a mailing list que eles conseguiram com as ações de seu site. Por lá, as novidades pintavam em primeira mão para os fãs antes de chegar às redações. Viram que essa era a forma mais rápida de espalhar uma notícia e apostaram nisso. Mais adiante, já no Japão, gravaram uma apresentação inteira da banda, com qualidade de DVD e deram para a MTV exibir nos países para os quais a turnê iria se encaminhar. No Brasil, o show do Japão foi assistido menos de um mês depois de ter acontecido e funcionou como aquecimento e jabá das apresentações. Mais adiante, fizeram uma competição internacional para que os fãs criassem o clipe da música “Lost”. Ganhou um irlandês. Depois, liberaram o download integral de uma música que aparecia em apenas um trechinho, como vinheta, no final do disco, mas que na real tinha nove minutos de duração… Enfim… Quem for à área de de notícias do site dos caras vai poder ver passo-a-passo de como tudo foi planejado. O lançamento de “LeftRightLeftRightLeft” parece ser o último capítulo do plano de marketing traçado minuciosamente pela banda e sua gravadora. 

Sem dúvidas, uma experência nova. Os resultados não são simples de serem medidos e parecem confidenciais demais para podermos ditar qualquer análise por ora, mas certamente mostram um novo momento do “star system”. Com a turnê do disco chegando ao fim, pode-se afirmar que assistimos a primeira grande empreitada de uma gravadora em busca de um planejamento de marketing que envolve a distribuição digital. Para avaliar se há esperança ou não pros antigos figurões do mercado talvez ainda seja cedo, mas agora há a experiência medida, calculada e analisada. A distribuição digital p2p é um caminho sem volta, claro, mas a (nova?) indústria finalmente procura caminhos além da execração do comportamento dos consumidores. Talvez estejam lembrando aquele velho dizer de que “o cliente tem sempre razão”.

Ah, e o novo disco, musicalmente, é bom? Pra quem curte, sim. Um bom registro, com áudios bem tratados, não fica nada a dever pro padrão de álbuns ao vivo que conhecemos. Além do que, não é um show só, são os melhores momentos de uma longa turnê. Chris Martin não salva o rock e talvez seu maior erro seja acreditar nisso e insistir em chamar essa responsabilidade pra si. Não fosse isso, o Coldplay poderia ser mais legal.