O show do Nação começou mais ou menos ao mesmo tem em que o dia de Zumbi, e deu largada à parte musical do Claro Cine – o evento da telefônica que pretende fortalecer a marca com fotos, histórias e movimentações em jornais, sites e blogs. Em outras palavras, criar e repetir imagens, imagens, imagens. Cada vez mais é por elas que percebemos o que acontece na nossa vida, e na hora de consumir e se divertir. E é em eventos assim que somos convidados a aparecer para criarmos, participarmos e reproduzirmos imagens. O que a gente faria de qualquer jeito.
       O celular substituiu o carro no imaginário do século XXI como a chave da liberdade. A criança se vê como independente quando ganha o telefone móvel, e nem precisa esperar o tempo todo que leva até completar 18 anos, como era preciso com o carro. Cada uma precisa do seu celular, vai com ele para todos os lugares e mostra o aparelho sempre que quiser. E ele tem várias funções, é multi: manda mensagens, grava vídeos, faz fotos. Tudo muito rápido, tudo uma cena, até mais interessante visualmente do que só colar o aparelho no ouvido e falar, aparentemente, sozinho. Cruelmente, o mesmo raciocínio vale para essas crianças (que podem ter de dez a vinte anos) e para classes de renda menor. O móvel não é mais o carro, mas a possibilidade de se comunicar e se registrar imediatamente.
       Um evento de celulares é, portanto, uma oportunidade para isso: imagens imediatas de afirmação de existência, de importância. Mesmo que, claramente, não seja voltado para crianças ou classes de renda menor. Muita gente precisa usar celular, mas nem todo mundo tem uma imagem que importa para marcar. Para consolidar uma marca. Para alimentar o círculo visual que insere e exclui histórias em um destino midiático de relações. Destino esse que mistura informação, realidade, símbolos, propagandas e sucesso.
       Para imagens, nada mais claro que cinema. Imagem em movimento com poder de realizar mitos, aventuras e dramas sem verdade e com emoção. A Internet chega lá de outra forma, mais difusa, de impacto mais difícil de controlar. Mas o videogame talvez não, daí a força de uma estréia com um filme justamente baseado em um game. Max Payne tem perseguições (que outra natureza de cena é mais a afirmação da imagem sobre o texto), alucinações, bandidos e mocinhos de duas caras, conspiração, anjos e drogas. Drogas perigosas, mas que acabam sendo a saída natural para o clímax da vitória do herói sem carisma.
       Aliás, o game over do filme é a falta de identificação entre o pobre herói que sente a falta da esposa assinada (a quem encontra em uma alucinação pré-morte e em outra por efeito da droga). Não fosse o ator o insosso Mark Wahlberg, e o roteiro fraco até poderia chamar menos atenção.
       Depois da exibição, voltam as fotografias, as cenas e os figurinos de uma noite de verão carioca, onde tudo tem que dar certo. O mesmo ingresso para o cinema vale para a festa (o show) e isso faz as pessoas circularem, se verem, se registrarem. São encontros premeditados, de um jogo irresistível. No roteiro, a apresentação do Nação Zumbi só preocupa mesmo uma ou outra cabeça da alta diretoria de sei-lá-o-que, em um canto fora de circulação. Será que vão invadir o palco e quebrar tudo?
       A banda de Pernambuco passa ilesa pela preocupação. Apesar de uma história de videoclipes menos extensa do que se suporia pelo tempo de estrada, não é uma banda que não saiba imprimir imagens. O público do clube nobre da zona sul tem mais ou menos os mesmos personagens que teria em uma lona cultural mais afastada do Centro ou no palco livre do Circo Voador – talvez só a proporção seja diferente: metaleiros camisa preta, barbudos de boina, gatinhas de sandalinha, supercools de todas as espécies, e playboys. Perfeito para uma boa festa, bom também para a coluna social moderna.
       E quando a música começa, tudo isso ganha outra perspectiva. O poder dos graves e dos ecos e distorções que ainda conseguem sabotar o previsível enfileira dicas como “todos os dias nascem deuses, alguns maiores e outros menores que você” e “a alma do negócio é você”. O público se divide entre os que caem no show, e os que ficam lá atrás, perto dos bares e dos encontros a céu aberto, descobertos. Foram duas interrupções no show, provavelmente a segunda fora do script, afinal se encerrou a noite com a menos cotada Risoflora, depois do tradicional Da Lama ao Caos-Manguetown com um convidado, Seu Jorge dessa vez.
       Os olhos brancos de Zumbi já eram o motivo do dia nascente.

      Imperdível ver no que vai dar o I Love Cafusu da noite de sexta, viu?
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